quarta-feira, 12 de maio de 2010

HISTÓRIAS DA MEIA NOITE

Essa aconteceu lá pro interiorzão do Paraná.

Preto “veio” sentado num banco de madeira à beira de uma fogueira já quase só na brasa, arrumava a “paia” de seu cachimbo. A netaiada mais os poucos vizinhos também estavam sentados em derredor da fogueira. Um grande bule de café fumegava encostado no braseiro enquanto algumas batatas doces estavam mergulhadas na brasa para deleite de todos.

A lua estava cheia e as estrelas cintilavam num céu negro. De vez em quando ouvia-se o piar de uma coruja, o mugido de um boi, o coaxar de um sapo.

“- Vô, conta uma história de medo pra nóis”?

“-Ói minino, num é bão ficá contano causos de medo não... Numa noite dessa pode inté aparecê o cramunhão em pessoa.”

“-Vixe Maria, Nossa senhora!” – exclamou Dona Clementina.- “Entoce é mio dexá isso pra lá.”

“-Mais eu vô contá, mode us mininu qué orvi.”

“-Eba!” – Exclamaram as crianças.

Preto véio arregalou os “zóios” como se estivesse olhando pra lugar nenhum, fez um suspense baforando a fumaça de seu cachimbo e começou...

A história era mais ou menos assim...

Há muito... muito tempo atrás vivia por aquelas bandas uma família de quatro pessoas: o pai; finado Severino, a mãe; finada Zefinha, o filho; finado Moacir e a filha Juliana, mas esta eles não sabiam se era finada ou não porque nunca mais ninguém tinha ouvido falar dela, coitada.

“_Nossa, vô! O que aconteceu com a moça?”

Dizem que era uma formosura de moça e por causa disso vivia se gabando, dispensava todos os pretendentes e dizia que só se casaria com um moço rico, loiro, alto e de olhos azuis. Ela ficava sempre na janela esperando que o tal pretendente passasse por ali. Dia após dia dali ela não arredava pé. Os moços da cidade, coitados, morriam de amores por ela, mas ela nem ligava e dizia sempre a mesma coisa :”- Só caso se for um moço loiro, alto, rico e de olhos azuis”. Um dia, já de tardezinha, quase anoitecendo, ela viu aproximar-se a carruagem mais bela que ela já tinha visto, a carruagem parou de frente com o portão da casa dela e desceu um lindo moço loiro, alto. Rico e de olhos azuis. Ele se aproximou e pediu um copo d’água, ela prontamente o serviu. Ele disse que havia comprado um belo castelo perto dali e que estava indo para lá ver se tudo estava certo. Disse, porem, que ao vê-la, admirou-a por demais sua beleza e encanto e que gostaria de conhecê-la melhor. A moça ficou muito feliz e convidou-o a entrar na casa dela.

“-Pai, mãe, irmão, venham conhecer uma pessoa que acabou de chegar na vila.

Vieram todos e ficaram encantados com os bons modos do rapaz que dizia chamar-se Lúcio.

Logo o rapaz manifestou seu desejo de namorar com aquela moça. Todos ficaram felizes, pois o rapaz era exatamente como a moça sempre sonhara.

Todos os dias, naquele mesmo horário ao cair da noite, aquele belo rapaz ia visitar sua noiva.

Um dia ela pediu:

“-Gostaria tanto de conhecer seu castelo, Lúcio.”

“_Não querida, é surpresa pra depois do casamento, já mandei vir da Europa os melhores decoradores para deixar meu castelo do jeito que você quiser.”

No dia do casamento o noivo pediu que se celebrasse a cerimônia ao ar livre, pois queria (dizia ele) ter o céu por testemunha daquele amor.

O casamento foi o dia mais feliz da vida de Juliana. Ao término da festa cada qual voltou para sua casa e Juliana entrou na rica carruagem que a conduziria até seu castelo com seu mais belo, alto, de olhos azuis e rico noivo.

Seguia feliz e ao longe, em meio a neblina da noite, vislumbrou a silhueta de seu castelo. Chegaram e os grandes portões de grossa madeira se abriram, lacaios vieram recebê-los sobre aplausos.

Lúcio pegou-a no colo e subiu com ela as escadarias iluminados por lindos candelabros até o quarto. A cama era enorme, toda coberta de rendas. Lúcio a colocou na cama e a luz bruxuleante do candelabro tornava o ambiente propício para uma bela noite de amor.

De repente ela sentiu um forte cheiro de enxofre e pasmada viu seu noivo transformar-se no mais horripilante demônio , tinha chifres, era vermelho, possuía um enorme rabo com uma espécie de triângulo na ponta e patas de bode. A bela cama transformou-se num chiqueiro cheio de lodo. Desesperada ela levantou-se e saiu correndo. O demônio ainda puxou-a pelo vestido branco rasgando-o.

“-Volte aqui! Agora você me pertence, é minha mulher”. _ Dizia ele com voz escabrosa e grossa.

Juliana correu muito e por todos os lados via os lacaios com caras demoníacas rindo dela. A moça viu um cavalo, não teve dúvidas, montou e galopou velozmente até a casa de seus pais. Esbaforida contava com palavras atropeladas o que tinha acontecido, mas antes dela terminar de contar viram a carruagem de Lúcio parar em frente a casa de seus pais.

“-Desculpe Seu Severino (dizia ele com sarcasmo que só Juliana sentia) , mas vim buscar minha mulher, afinal eu me casei com ela. Uma mulher não pode abandonar o marido, não sei o que deu nela, de repente saiu correndo feito doida. Fiquei preocupado (sorria cinicamente). Ela é meio destrambelhada mesmo? Começou a dizer, sem mais nem menos, que eu era o Diabo, imagine! Vamos Juliana, agora você me pertence.”

“-Não pai! Não deixa ele me levar!”

“-Filha, ele tem razão, você agora é a esposa dele e vocês têm que viver juntos até o fim.”

“-Não pai!” -gritava ela enquanto era puxada por Lúcifer até a carruagem.

Os pais ficaram sem entender, mas nada podiam fazer, pois naquele tempo quando a moça casava devia obediência ao marido. A carruagem sumiu na escuridão da noite e até hoje nunca mais ninguém soube da pobre Juliana.

“-Cruzes! Que história mais feia!”

“-Mais é a mais pura verdade. Dizem qui diveiz em quando arguém inda vê uma noiva toda esfarrapada galopano por aí gritano estridentimente.”

Todos, em volta daquela fogueira fizeram o sinal da cruz e trataram de ir para casa rapidinho antes que aparecesse a tal noiva do Demo, e com o pensamento de nunca serem orgulhosos como Juliana.

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